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#585 As leis da lógica e o argumento cosmológico

January 20, 2019
Q

Olá, Dr. Craig.

Sou cristão e muito grato por seu trabalho. Minha pergunta diz respeito às leis da lógica e o argumento cosmológico. Se alguém disser que, da perspectiva naturalista, algo pode advir do nada por meio de nada, sabemos que está quebrando as leis da lógica. Porém, se não havia nada, incluindo a lógica, não seria possível que algo tão impossível quanto o universo, do nada e por meio de nada, viesse a existir, já que não havia leis da lógica para ser quebradas? Ao que me parece, é preciso, primeiramente, provar que as leis da lógica são eternas e, só então, usar o argumento cosmológico.

Agradeço mais uma vez. Deus abençoe.

Daniel

Estados Unidos

United States

Dr. Craig responde


A

Sua pergunta revela um amontoado de confusões, Daniel. Acho que vale a pena abordá-las, uma vez que elas parecem não ser incomuns entre o grande público na internet.

Para começar, não digo que a afirmação “algo pode advir do nada, por meio de nada” quebre as leis da lógica. Muito pelo contrário, afirmei que a negação do princípio causal não é, estritamente, impossível do ponto de vista lógico. Antes, o princípio causal segundo o qual “Tudo o que existe tem uma causa” é, na minha perspectiva, uma verdade metafisicamente necessária cuja negação é, estritamente, impossível do ponto de vista lógico, embora não seja realizável. Assim, não se pode condenar o naturalista que nega o princípio e diz que o universo veio do nada como se estivesse quebrando as leis da lógica.

Em segundo lugar, parece haver confusão quanto à condição ontológica das leis da lógica. Você parece assumir que deve existir alguns objetos, algumas coisas, aos quais a expressão “as leis da lógica” se refira. Isto é totalmente injustificado. Com frequência, usamos tais expressões em enunciados que consideramos verdadeiros sem pensar que se referem a objetos reais no mundo, p. ex., “evitou-se o acidente”, “o furo em sua camisa”, “a falta de compaixão no mundo”, “o bem-estar das crianças”, “a ameaça de greve” etc.

Não penso que existam tais coisas, tais objetos, a saber: as leis da lógica. As leis da lógica são simplesmente um meio de codificar inferências como: “Necessariamente, se João é gordo e Maria é magra, João é gordo”. Codificamos este caso como a regra da inferência denominada simplificação (simbolizada como P&Q, logo P). A simplificação não existe como coisa; é apenas um meio válido de raciocínio inferencial.

Pois bem, se você pensa que as leis da lógica, de fato, existem, elas devem ser objetos abstratos de alguma forma, presumivelmente proposições, uma vez que possuem valor de verdade. Assim, existiriam fora do tempo e do espaço, já que não dependem de objetos físicos. Portanto, estariam isentos do princípio causal, por nunca terem começado a existir.


Por vezes, pessoas sem instrução alguma em lógica dirão: “Não se pode extrapolar as leis da lógica para além do universo. Elas valem para nosso universo, mas não se pode assumir que se aplicam além dele, de modo a inferir uma causa do universo”. Observe como a afirmação é radical: o objetor não está negando a verdade do princípio causal; antes, está negando que, das verdades segundo a qual “Tudo que começa a existir tem uma causa” e “O universo começou a existir”, pode-se validamente inferir que “O universo tem uma causa”. Ele admite que tais afirmações são verdadeiras, mas nega a regra lógica da inferência conhecida como modus ponens (simbolicamente, P → Q; P; logo, Q). Ele afirma que a validade desta inferência se restrinja a nosso universo, além do qual nossa inferência não possa ser feita validamente.

Penso ser óbvio que o objetor, no caso, tenha um enorme ônus da prova. Ele deve provar que as leis da lógica, de algum modo, dependem de nosso universo físico. Isto soa patentemente falso. Suspeito que quem insiste em tal objeção não entende o que seja lógica. Lógica, enquanto disciplina puramente formal, é desprovida de qualquer conteúdo empírico e, portanto, é totalmente independente de coisas físicas. Nesse sentido, é como a matemática. Dadas as definições de “2”, “+”, “=” e “4”, é necessariamente verdade que 2 + 2 = 4. Igualmente, dados os significados de “&” e “→”, é necessariamente verdade que P&Q → P. O universo não tem nada a ver com isso. De fato, um ramo da lógico é a chamada lógica modal, que nos permite fazer inferências sobre qual seja o caso em outros mundos possíveis. O objetor invalidaria todo um ramo da lógica apenas para evitar a inferência do teísmo.

Não penso que os céticos que insistem nessa objeção percebam plenamente onde ela os deixa. A implicação é que o ateísmo (ou agnosticismo) é literalmente ilógico. O objetor concede que é a visão teísta que segue logicamente das premissas aceitas. A fim de evitá-la, é preciso negar as leis da lógica. O ateísmo, portanto, é ilógico, uma vez que, de acordo com tal objeção, ele está fundamentado na negação das regras lógicas da inferência, como modus ponens. Isto deveria incomodar sobremaneira os ateus. Acontece que os crentes é que são, de fato, os pensadores lógicos.

Por fim, a posição do objetor é contraditória. Como ele conseguirá justificar sua restrição das leis da lógica ao nosso universo? Qualquer justificativa terá de envolver a suposição de uma perspectiva e raciocínio transcendentes acerca de nosso universo. Mas é justamente tal raciocínio que a objeção proíbe. Por exemplo, suponha que o objetor diga: “As leis da lógica foram inventadas por seres humanos. Logo, elas não têm nenhuma aplicabilidade além do universo”. Da perspectiva do objetor, tal inferência vale apenas em nosso universo e nada diz sobre o que vale além de nosso universo. Ele não pode afirmar com justiça que as leis da lógica não se aplicam além de nosso universo. Qualquer tentativa de justificar a objeção é, portanto, contraditória.

- William Lane Craig