#298 A Aposta de Pascal
March 24, 2013Olá Dr. Craig,
Eu sou estudate de biologia molecular na Universidade do Maine, em Augusta. Eu sou um católico romano que adora assistir aos vídeos de seus debates com ateus – admiro a sua eloqüência e capacidade argumentativa. Que eu saiba, você nunca invocou a Aposta de Pascal como um argumento para a crença em Deus, mas eu tenho visto ela sendo usado por outros cristãos que, aparentemente, acreditam que esse argumento é um golpe mortal contra o ateísmo. Eu, pessoalmente, tenho uma visão mais cética e gostaria de saber se você poderia comentar os seguintes pontos:
Primeiro, como é que sabemos em que Deus acreditar? A existência de milhares de Deuses já foi postulada e parece que a probabilidade de escolhermos o correto é bem pequena. Além disso, se, como eu já ouvi, Deus – qualquer um deles – compreende a nossa crença equivocada e, apesar de termos escolhido o Deus "errado," não nos julga com base em nossa crença equivocada, mas em nosso esforço honesto de descobrir a verdade, por que Deus não compreenderia um ateu que, após uma busca honesta, conclui que Deus não existe? Parece-me que não existe distinção significativa entre, de um lado, escolher o Deus errado, mas ao menos acreditar em algo, e, do outro, escolher o Deus errado, mas não acreditar em nada.
Em segundo lugar, o argumento é geralmente elaborado como se não houvesse nenhum custo em se acreditar em Deus quando Deus, de fato, não existe: que o erro não te custou nada na vida. Mas, certamente, o tempo gasto em oração desnecessária, o esforço de fazer de tudo para ser bom, a abstinência de atividades prazerosas que são consideradas pecaminosas, a contribuição financeira para organizações religiosas, etc, é um preço considerável a se pagar. Assim, não há um cálculo probabilístico a ser feito para comparar o custo-benefício da descrença quando se está errado (isto é, Deus, de fato, existe) e o custo-benefício do alinhamento do comportamento de uma pessoa com a "vontade de Deus" caso Deus não exista? E, se tal cálculo é necessário, então argumentos para a existência de Deus devem ser considerados para determinar a probabilidade; e, assim, a Aposta de Pascal não poderia funcionar como um argumento autônomo, mas exigiria outros argumentos teístas.
Muito obrigado por responder à minha pergunta e pelo excelente trabalho que você faz. Deus te abençoe.
Liam
United States
Dr. Craig responde
A
Liam, eu trato da Aposta de Pascal no capítulo sobre "Epistemologia Religiosa" em Filosofia e Cosmovisão Cristã. Para aqueles que não estão familiarizados com o argumento de Pascal, eu vou resumi-lo brevemente. Pascal argumentou, com efeito, que a crença em Deus é justificada pragmaticamente porque não temos nada a perder e tudo a ganhar com essa crença.
Embora a Aposta de Pascal possa ser formulada de várias maneiras, uma maneira de entendê-la é através da construção de uma matriz de pay-off exibindo os benefícios esperados de suas escolhas em relação à verdade da crença de que Deus existe:
Na Aposta de Pascal, presume-se que os estados (I) e (II) têm a mesma probabilidade (as evidências a favor e contra a existência de Deus têm exatamente o mesmo peso). Portanto, a decisão de acreditar ou não acreditar tem de ser feita de forma pragmática. Pascal raciocina que, se eu acredito que Deus existe, e Ele de fato existe, então eu obtenho um lugar no céu, com o pequeno sacrifício de abrir mão dos prazeres do pecado por algum tempo. Se eu acredito, mas Deus não existe, então eu não ganhei nada e sofri a perda finita dos prazeres do pecado dos quais eu abri mão. Por outro lado, se eu não creio e Deus existe de fato, então eu ganhei os prazeres do pecado por algum tempo à custa de perder a vida eterna. Se eu não acreditar e Deus não existir, então eu tenho o ganho finito dos prazeres proporcionados pelo meu estilo de vida libertino. Assim, a crença em Deus é, pragmaticamente, a melhor escolha.
Agora, eu acho que você pode ver que Pascal formulou o argumento de tal forma a atender às preocupações da sua segunda objeção. Ele admite que, se Deus não existe, há alguma perda finita como resultado da crença. Ele também pressupõe que as evidências a favor e contra a existência de Deus são iguais. Pascal está pressupondo que não há bons argumentos para a existência de Deus, mas, do mesmo modo, que não há bons argumentos contra a existência de Deus. Assim, a probabilidade de que Deus exista é tida como sendo 50/50. Eu suspeito que Pascal também diria que aqueles que apostam contra Deus assim o fazem por dureza de coração e desinteresse nas coisas espirituais e, por isso, não há desculpa para a sua incredulidade.
Na verdade, é a primeira objeção à Aposta de Pascal que você mencionou que é a objeção séria: a chamada objeção dos "muitos deuses." Um muçulmano poderia criar uma matriz de pay-off semelhante para a crença em Allah. Um mórmon poderia fazer a mesma coisa para o seu deus. Em outras palavras, o estado (II) Deus não existe é, na verdade, uma disjunção indefinidamente complexa de várias divindades que podem existir se o Deus cristão não existe. Assim, a escolha não é tão simples, porque, se eu acreditar que o Deus cristão existe, mas, na verdade, Allah existir, então eu sofrerei perda infinita no inferno pelo meu pecado de associar algo (Cristo) com Deus.
Há duas respostas possíveis a essa objeção. Primeiro, num contexto de decisão teórica, somos justificados em ignorar os estados que têm uma probabilidade remotamente pequena de obtenção. Assim, eu não preciso me preocupar com a possibilidade de que, digamos, Zeus ou Odin possam existir. Se a chance dessas outras divindades existirem é desprezível, então eu estaria justificado em criar uma matriz de payoff, segundo a qual a chance de existência do Deus cristão é considerada como sendo de aproximadamente 50/50. A escolha é, efetivamente, entre o cristianismo e o ateísmo.
Em segundo lugar, poderíamos tentar limitar as opções disponíveis às duas à mão ou a um número manejável de alternativas. Essa pode ter sido a estratégia do próprio Pascal. A Aposta é um fragmento de uma Apologia para o teísmo cristão maior e inacabada, interrompida pela morte prematura de Pascal. Quando olhamos para outros fragmentos desse trabalho, descobrimos que, apesar de Pascal desprezar os argumentos filosóficos para a existência de Deus, ele abraçou com entusiasmo as evidências cristãs, tais como a evidência para a ressurreição de Cristo. Pode ser que ele tenha pensado que, com base em tais evidências, as opções disponíveis poderiam ser reduzidas ao teísmo cristão e o naturalismo. Se as alternativas podem ser reduzidas dessa forma, então a Aposta de Pascal é bem sucedida.
- William Lane Craig