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#460 Perguntas sobre Deus e objetos abstratos

May 13, 2016
Q

Olá, meu nome é Lana, eu fiz um curso na Universidade Purdue chamado “Metafísica”. Eu o vi em um debate com Alex Rosenberg. Enfim, estou feliz por ter feito este curso, mas eu não levei o nominalismo, ou o que você chama de anti-realismo, tão a sério. Ao final eu me tornei uma platonista muito rigorosa, até que eu re-li o evangelho de João e me dei conta de que estava em grande problema, chegando às mesmas conclusões sobre o platonismo que você chegou. Eu era uma platonista até então. Assim eu me debatia ao pensar qual seria a verdade. A princípio eu não levava a sério o conceitualismo divino porque este me foi apresentado por Berkleyanistas e eu realmente detesto idealismo. Não acho que este seja compatível com o cristianismo. Porém, analisei-o novamente e percebi que o conceitualismo divino pode funcionar com uma cosmovisão que rejeita Berkley e seus semelhantes. Não me lembro muito bem do curso e, caso eu cometa algum equívoco esta é a razão, talvez eu não entenda este jargão, mas em algum momento você respondeu minha pergunta. Eu preciso de alguma direção.

Então eu li alguns dos seus artigos sobre o que você tinha a dizer, e você me convenceu a levar o nominalismo muito a sério. Eu estou torcendo por você, porque realmente quero que você esteja certo, pois acho que isso se encaixa tão bem com todas as perguntas que eu tive por anos. Primeiramente você menciona figuralismo e ficcionalismo, mas não a teoria de tropos, por quê? Ela é tão popular, pelo menos ao meu ver, embora me lembre de meu instrutor dizendo que tropo é quase universalismo disfarçado. Não sei, mas aqui está minha queastão/crítica. Este era meu principal argumento contra o nominalismo antigamente, e ele me convenceu de ser uma platonista.

Como você lida com o espécime versus tipo no nominalismo/anti-realismo? O que você acha que são os tipos? Muitas pessoas parecem dizer que são universais ou tropos, mas quais são as alternativas existentes? Perguntei a amigos e lembro-me de que responderam que entendiam ser um tipo de círculo “de suposições”, sendo simplesmente a descrição das características físicas que um objeto pode assumir. Tipos são formas fáceis de categorizar o mundo ao nosso redor, como ele realmente aparenta.

Eu nunca tive tempo para mergulhar fundo o bastante nas distinções sobre espécime versus tipos para saber realmente se isso é sustentável, mas realmentente soa como explicações de ficcionismo ou figuralismo.

Então pode ser que eu tenha perdido isso em seu debate, mas como você explica o fato de haver formas idênticas por aí, chamada de círculos. Como todas elas são idênticas neste sentido? Minha resposta costumava ser: “Bem, há coisas universais, esta é a razão pela qual são todas exemplificadas pela mesma fonte”. Conceitualismo divino também tem uma resposta fácil pra isso, vem de uma idéia na mente de Deus. Mas e sobre as outras teorias que você defendeu? Mas, ao mesmo tempo, eu preciso de alguma outra fonte, além de Deus, para explicar isso? Esta é uma suposição. Mas também não é uma má idéia.

Também tenho outra pergunta, você disse que a ideia de Deus criando universais é como “levantar a si mesmo puxando o próprio cadarço”, eu concordo completamente, mas tenho dificuldade em entender como isso difere do conceitualismo divino. Assim, nesta última teoria, Deus é sábio, e porque Deus é sábio ele teve a idéia da sabedoria? Então elementos além de Deus exemplificam sabedoria? Estou entendendo corretamente? Não sei. No nominalismo Deus é simplesmente sábio, fim da história, muito simples. Amo isso.

Se não tiver tempo para me responder, eu entendo. Uma oração a Jesus Cristo, com fé, será suficiente.

De qualquer maneira, Deus o abençoe!

Lana

Estados Unidos

United States

Dr. Craig responde


A

Tenho que estar atento ao fato, Lana, de que embora você e eu estejamos interessados em Deus e os objetos abstratos, a maioria dos meus leitores provavelmente não estejam, portanto tenho que resistir para não tratar tantas perguntas sobre este tema. Mas o tom da sua carta foi tão doce que eu simplesmente não pude resistir. Então aqui vai!

Sua primeira pergunta é sobre o por que de eu não mencionar a teoria de tropos. A razão é simplesmente porque é uma solução muito estreita para ser aplicada a uma grande variedade de objetos abstratos. Os tropos são destinados a serem substitutos concretos para propriedades abstratas. Mas ainda que se substituamos propriedades abstratas por tropos concretos, isso não nos ajudaria com objetos matemáticos como números, conjuntos, e assim por diante. Eu menciono em meu livro versões de realismo concreto sobre objetos matemáticos, o que os leva a ser realidade física. Mas, assim como para a maioria dos filósofos, isso parece-me ser algo bastante implausível e, penso eu, inferior às versões conceptualistas do realismo concreto, que levam tais objetos a serem estados mentais ou eventos, mais plausivelmente na mente de Deus.

Depois você pergunta: “Como você lida com o espécime versus tipo no nominalismo/anti-realismo?” Eu não lido com isso porque tipos, se existem, não são do tipo de objeto abstrato que ameaçam a asseidade (auto-existência) divina e que me preocupem. Alguns objetos abstratos, caso existam, são entidades plausivelmente criadas e condicionais, tal como o Equador, o centro da massa do sistema solar, personagens fictícios, obras musicais e literárias, e assim por diante.

Tipos de frases parecem se enquadrar dentro desta categoria. Como entidades linguísticas (em contraste com proposições), os tipos de frases parecem ser os subprodutos da linguagem humana, portanto são condicionais e não eternos. Tal abstracta não apresentam ser um desafio à asseidade divina e por isso não me preocupam. Não estou inclinado a acreditar em tais coisas, mas não é algo que me incomodaria se alguém o fizesse. Tipos de frases são postuladas com a finalidade de explicar, por exemplo, como é que você e eu pronunciamos a mesma frase, quando sons diferentes saem da sua boca aos serem comparados com a minha. Suponho que tipos de frases são elementos de faz-de-conta que imaginamos existir porque é muito útil fazê-lo. Mas não tenho uma opnião forte sobre isso, pra mim é indiferente se tipos de frases existem.

Em relação às formas, confira meu diálogo com Peter van Inwagen a esse respeito, recentemente publicado na Philosophia Christi. [1] Quanto à questão do por que das coisas terem a mesma forma, esta é uma versão de um problema antigo de Um sobre Muitos. Parece-me que semelhança não é a real questão aqui, mas sim por que um objeto em particular é, por exemplo, esférico. Se você puder explicar o porque um objeto é esférico e porque um outro objeto é esférico, então não há nada mais para ser explicado. Certamente não explicaria nada dizer que eles são esféricos porque têm uma relação primitiva casual disconectada com um objeto abstrato da esfera. Tal afirmativa me parece ter um vácuo explicativo, parecido como explicar que “poderes soníferos” são a razão de algumas drogas fazê-lo dormir.

Finalmente, penso que o conceitualismo divino pode evitar dar início ao problema (bootstrapping) que enfrenta o criacionismo absoluto, caso o conceitualismo rejeite o ensaio ontológico platonista das coisas, que é negar que as mesmas estejam ontologicamente compostas de propriedades e algo mais. O conceitualista pode adotar a visão antiga de objetos abstratos como abstrações: elas são formadas ao ter a mente abstraindo-se para longe de tudo a não ser, digamos, sua forma. Nesta perspectiva, ainda que Deus seja, digamos, onipotente, a propriedade da onipotência não existe até que Deus pense nisso. Assim, logicamente antes de que Ele o pense, onipotência não existe, ainda que um Deus onipotente exista. Aqui não é um círculo vicioso!

A pergunta é se os criacionistas absolutos não poderiam dizer algo semelhante aqui: logicamente, antes de que Ele a crie, onipontencia não existe, ainda que um Deus onipotente exista. Chego a pensar que os criacionistas absolutos poderiam coerentemente dizer tal coisa. Na verdade, van Inwagen é um platonista que não rejeita o típico ensaio platônico ontológico das coisas. Em sua visão Deus não é composto de propriedades e algo mais, e as propriedades também não servem para explicar o porque das coisas serem como são. Então um platonista do estilo de van Inwagen poderia abraçar o criacionismo absoluto sem o círculo vicioso.

Entretanto, uma vez que alguém rejeita o ensaio ontológico platonista, o nervo do realismo sobre propriedades, seja ele criacionista ou conceitualista, parece ser cortado. É simples, como você disse, ser um anti-realista e seguir sem eles – mas então há que responder o argumento de que não podemos prescindir de tal abstração, pois nos referimos a elas e as quantificamos em sentenças que aceitamos como verdadeiras, o qual é o tema do meu livro.

  • [1]

    Peter van Inwagen, “Did God Create Shapes?” and William Lane Craig, “Response to Bridges and Van Inwagen,” Philosophia Christi 17/2 (2015): 285-298.

- William Lane Craig