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#438 Desobedecendo a Suprema Corte

November 28, 2015
Q

Olá Dr. Craig.

Eu devo dizer que eu comecei minhas viagens como um agnóstico, e depois de assistir a uma infinidade de seus debates, ler seu livro Reasonable Faith [Fé Razoável], e de examinar seu website, eu confesso estar impressionado com a amplitude e profundidade de sua pesquisa. Eu vim a aceitar o cristianismo. De fato, grande parte da apologética que eu uso agora para ajudar os outros a entenderem o que eu tive dificuldade de entender eu aprendi com você! Portanto, obrigado por isso.

Recentemente, com a legalização do casamento gay nos Estados Unidos, alguém me explicou que a Bíblia diz que resistir as autoridades seria diretamente contra a vontade de Deus. Para apoiar isso, ele me mostrou Romanos 13:1-7. Os versos parecem sugerir que a autoridade é colocada por Deus, e que temos que obedecê-las porque desobedecer seria semelhante a desobedecer a Deus.

Aqui estão minhas perguntas:

1. Em geral, se Deus ordena toda autoridade (como parece sugerir o verso 1 e 2), este capítulo intenciona dizer que nós não devemos resistir a autoridade mesmo se os comandos da autoridade aparentemente entram em conflito com a vontade de Deus?

2. Quais são as implicações para isto no caso da decisão da Suprema Corte?

3. O que estes versos implicam para os Alemães que foram ordenados a matarem Judeus nos campos de concentração ou em outros tais cenários?

Em resumo, esta parte do capítulo me confunde muito, e talvez você pudesse colocar um pouco de luz onde eu estou conflitando aqui.

Obrigado!

Nathan,

Estados Unidos

United States

Dr. Craig responde


A

Eu estou muito feliz, Nathan, de ouvir que você é parte da crescente família dos filhos de Deus! Como você observa, a recente decisão da Suprema Corte de legalizar o casamento do mesmo sexo vai colocar alguns cristãos em posições muito estranhas e agonizantes.

Antes de abordar suas questões, deixe-me emitir uma correção. A Suprema Corte não legalizou, nem ninguém está advogando para, o casamento gay. O que foi legalizado foi o casamento do mesmo sexo, independentemente da orientação sexual. Qualquer decisão ou lei que restringisse o casamento do mesmo sexo a casais gays ou lésbicos seria manifestamente discriminatório contra pessoas heterossexuais. As leis de casamento neste país devem ser (e tem sempre sido) cegas com respeito a orientação sexual das pessoas envolvidas. Se o casamento é, essencialmente, entre um homem e uma mulher, isto realmente não tem nada a ver com a orientação sexual deles. O que a Suprema Corte fez foi redefinir o casamento de tal forma que não mais se pertence a essência do casamento a união entre um homem e uma mulher – agora dois homens e duas mulheres podem legalmente se casar, independentemente da orientação sexual deles.

Agora como pessoas pensadoras e como cristãos, nós não podemos condescender com a tentativa da Suprema Corte de redefinir o que é o casamento. Cinco advogados (como os juízes dissidentes os chamaram) não podem mudar a essência do casamento mais do que eles podem mudar a essência de um cavalo ou uma cadeira. Então, agora nós nos vemos numa sociedade onde há casamentos legais que são na realidade pseudo-casamentos. Estas pessoas não estão realmente casadas, mas elas estão legalmente casadas.

Agora, já que, como você observa, nós cristãos estamos sujeitos às autoridades governantes da sociedade na qual nos encontramos, nós temos que obedecer às leis a menos que elas nos obriguem a fazer coisas que seriam imorais, [1] ou seja, que contrariam a vontade de Deus ou Seus mandamentos. Por exemplo, quando as autoridades de Jerusalém ordenaram os primeiros apóstolos a deixarem de pregar em nome de Jesus, Pedro e João fortemente responderam: “Julguem os senhores mesmos se é justo aos olhos de Deus obedecer aos senhores e não a Deus. Pois não podemos deixar de falar do que vimos e ouvimos” (Atos 4:19-20). Similarmente, quando os Imperadores Romanos pagãos ordenaram os cristãos a queimar incenso aos deuses pagãos, os cristãos resolutamente recusaram, sofrendo torturas indescritíveis e execução em vez de violar sua consciência.

Portanto, em respostas as suas perguntas:

1. “Nós não devemos resistir a autoridade mesmo se os comandos da autoridade aparentemente entram em conflito com a vontade de Deus?” Não; nós temos e devemos resistir a autoridade se ela nos obriga a agir contrário a vontade de Deus. Se isso não acontecer, então nós devemos obedecer mesmo se nós não concordarmos com as diretivas da autoridade.

2. “Quais são as implicações para isto no caso da decisão da Suprema Corte?” Esta é a pergunta de $64,000 dólares! Obviamente, a lei não nos obriga a casar com alguém do mesmo sexo, então nós não estamos sendo forçados a ir a uniões ilícitas. Mas nós precisamos reconhecer, ao que me parece, que outras pessoas que nós conhecemos podem estar legalmente casadas e, portanto, ter certos direitos legais que nós devemos respeitar, desde que isto não nos obrigue a agir imoralmente. Os casamentos deles são algum tipo de ficção jurídica que nós devemos respeitar.

É onde as coisas ficam complicadas. Suponha que você é um padeiro que é requisitado para fazer um bolo de casamento para um casamento homossexual ou que você é um fotógrafo de casamento que é contratado para fotografar uma cerimônia homossexual. É difícil ver como você pode justificavelmente resistir a autoridade legal aqui e se recusar a condescender, independentemente de quão desagradável isso possa ser para você, desde que sua atividade de sua parte é não pecar. Casos como este mostram por que, como eu alertei, a decisão sobre casamento do mesmo sexo não é um assunto privado, mas que tem implicações que vão muito além dos casais envolvidos. Porque casamento é uma instituição cívica e pública, a redefinição do casamento tem implicações em larga escala que podem afetar a todos nós.

O caso de Kim Davis, a oficial de justiça em Kentucky que foi presa por se recusar a emitir licenças de casamento para casais do mesmo sexo, é um caso mais difícil. Ela diz que ela não pode em sã consciência colocar sua assinatura em tais licenças porque isso constituiria sua aprovação da união, da qual ela não aprova. As pessoas que dizem “É a lei! ”, não apreciam seu dilema moral. Quando Jan e eu visitamos a Nova Zelândia há alguns anos atrás, o poder legislativo tinha acabado de aprovar uma lei, mesmo com a oposição de legisladores cristãos, legalizando a prostituição. Pior, a lei permitia bordeis a serem abertos em qualquer lugar, até mesmo no seu bairro ou próximo a uma escola. Eu posso imaginar um oficial cristão do governo a ser chamado para assinar uma permissão de zoneamento para tal bordel e encontrar ele mesmo incapaz de em boa consciência fazer isso. As pessoas que displicentemente afirmam, “É a lei!”, não parecem se lembrar da lei de Jim Crow no Sul segregacionista ou das leis antissemita na Alemanha Nazista.

Em alguns casos, nós talvez tenhamos que resistir a autoridade legal porque isso requereria de nós agir imoralmente. Nós estamos assegurados que ministros e padres não serão exigidos por lei a realizar casamentos do mesmo sexo. Mas suponha que você é um capelão militar que é chamado para realizar uma cerimônia de casamento de dois homens ou duas mulheres na unidade que você serve. Você pode considerar tal ação de sua parte como imoral (independentemente da legalidade) e assim encontrar-se incapaz de obedecer. Você provavelmente será dispensado do serviço como resultado. O resultado trágico será um peneiramento de capelães Cristãos nas nossas forças armadas.

Similarmente, instituições educacionais cristãs podem encarar a perda de financiamento federal de empréstimos estudantis ou bolsas de estudo ou até mesmo a perde de isenção de impostos por não condescender com as leis que ratificam casamentos do mesmo sexo. Para que você não ache tais preocupações alarmistas, elas foram faladas pelos juízes Roberts e Scalia durante as audiências da Suprema Corte e nunca foram adequadamente abordadas pelo advogado discutindo o caso.

Haverá situações nas quais cristãos serão forçados por consciência a infringir a lei, como se eles estivessem no início do Império Romano. À medida que nossa cultura secular se torna mais e mais condescendente com o casamento do mesmo sexo, a pressão sobre cristãos para se comprometer e agir de acordo será pesada e implacável.

3. “O que estes versos implicam para os Alemães que foram ordenados a matarem Judeus nos campos de concentração ou em outros tais cenários?”Aqueles que foram ordenados foram obrigados a desobedecer às autoridades governamentais, desde que obedecer seria pecar. A recusa deles a condescender e agir igualmente significou que muitos cristãos na então chamada “Igreja Confessante” (die bekennende Kirche) pereceram juntamente com os judeus nos campos. Nós teremos a coragem deles nos tempos de uma cultura cada vez mais hostil?

  • [1]

    Ou eles tratam os outros imoralmente, como no caso da lei de ordenando a segregação racial.

- William Lane Craig