#661 Agentes imateriais e dilatação do tempo
February 02, 2020Caro Dr. Craig,
Até recentemente, era materialista reducionista, mas fiquei tão inspirado com seu trabalho que mudei de ideia. No entanto, estou lutando com a pergunta a seguir. Antes de formulá-la, saiba que meu conhecimento de relatividade especial advém especialmente de interesse pessoal. Não sou mesmo especialista no assunto; por isso, meu entendimento talvez seja falho ou incorreto.
Minha pergunta é esta: como podemos compreender a dilatação do tempo de coisas imateriais? Considerando a teoria especial de relatividade de Einstein e, especificamente, o exemplo do relógio de fóton, sabemos que, se um observador X, segurando um relógio de fóton, está passando pelo observador Y, o quadro de referência X experimenta dilatação do tempo com relação a Y. O observador Y vê os tique-taques do relógio em X diminuírem em proporção à velocidade de X, passado Y. Isto se deve à duração dos tique-taques do relógio diferir em cada quadro de referência, enquanto a velocidade do fóton permanece constante. Ora, para o observador X que vê seu relógio, minha interpretação é que ele experimenta o tique-taque normal do relógio, e não lento. Se isto é correto, a percepção e a consciência do observador X também estão sujeitas à dilatação do tempo.
O materialista diria que faz sentido, pois o observador é composto apenas de órgãos que consistem somente de estruturas atômicas, e estas são, essencialmente, relógios de fóton. Estruturas neurais físicas e impulsos elétricos do cérebro são relógios físicos. Em outras palavras, essas estruturas físicas na “mente” experimentam a dilatação do tempo da mesma forma que o relógio físico de fóton. Por isso, o relógio de fóton e a “mente” física do observador X dilatam juntos, o que faz com que o observador X experimente tique-taques normais.
Se rejeitamos o materialismo, como podemos entender a dilatação do tempo do indivíduo imaterial?
Obrigado!
Aaron
Estados Unidos
United States
Dr. Craig responde
A
Que pergunta bem pensada, Aaron!
Para quem não tem o conhecimento científico de Aaron, permita-me explicar brevemente que, de acordo com a Teoria Especial da Relatividade de Einstein, um relógio em movimento uniforme move-se devagar em comparação com outro relógio tido como em repouso. O exemplo do relógio de luz ilustra esta verdade. Imagine que o relógio marca o tempo ao enviar um feixe de luz para um lado e para o outro, entre o topo e a base do relógio. Num relógio em repouso, o feixe é perfeitamente perpendicular e atravessa a distância mais curta entre o topo e a base. Imagine, porém, que um relógio parecido em rápido movimento está passando por você. Os feixes de luz desse relógio não estarão em movimento perpendicular em relação a você: eles devem viajar numa espécie de padrão de ziguezague, para que o relógio funcione. Uma vez que as distâncias atravessadas pelo feixe de luz no relógio em movimento não são as mais curtas, levará mais tempo para que o feixe chegue ao outro lado do relógio. Assim, o relógio vai rodar devagar em relação ao observador tido como em repouso. Porém, conforme observa Aaron, a pessoa que está viajando com o relógio o vê funcionando como se ele estivesse em repouso — de fato, para si, o relógio está em repouso e, portanto, não é afetado em sua marcação do tempo. É o relógio do outro sujeito que está em movimento relativo e, portanto, move-se devagar!
Será que a dilatação do tempo apresenta um desafio ao dualista de substância que considera ser a alma ou mente distinta do cérebro? Não vejo por quê. O dualista de substância não pensa na alma como o proverbial “fantasma na máquina”, mas, sim, como se estivesse intimamente conectada com o cérebro para operar conjuntamente no pensamento. Como a pessoa cujo cérebro foi danificado pelas drogas ou acidente será incapaz de pensar normalmente, assim também a pessoa cujo relógio biológico foi desacelerado pensará mais devagar em relação a um observador tido como em repouso.
Os processos neurais da pessoa serão desacelerados e, consequentemente, seu pensamento. O problema proposto pela dilatação do tempo não é, na verdade, nem um pouco mais difícil do que o fato de que sinto dor quando se derruba um tijolo no meu pé.
Para saber mais sobre os seres humanos como uniões psicossomáticas, veja os capítulos de meu colega J. P. Moreland sobre filosofia da mente na segunda edição de nosso livro Philosophical Foundations for a Christian Worldview [primeira edição publicada em português com o título Filosofia e cosmovisão cristã].
- William Lane Craig